Já te questionaste porque mudar de carreira parece ser tão difícil? Descobre os desafios e as soluções.

Antes de explorarmos os desafios da transição de carreira, é crucial refletirmos sobre duas tendências que têm moldado o mundo do trabalho nos últimos anos.

Primeiro, observamos uma mudança significativa nas mentalidades em relação à reforma e ao trabalho. Cada vez mais, as pessoas questionam a ideia tradicional de esperar pela reforma para se ser feliz. Em vez disso, procuram formas de encontrar significado e satisfação no trabalho, ao longo de toda a vida, reconhecendo que a realização pessoal não deve ser adiada indefinidamente, sob pena de vivermos dilacerados, numa vida em que separamos o trabalho, do prazer. Esta mudança de mentalidade tem impulsionado um aumento exponencial no número de pessoas que todos os dias questionam as suas vidas profissionais estagnadas e desprovidas de sentido, e procuram novas oportunidades de crescimento e de realização profissional que possam aliar a um propósito de vida.

Além disso, enfrentamos a necessidade urgente de todos nos adaptarmos ao rápido avanço da inteligência artificial (IA) e da automação. Com o surgimento de tecnologias mais disruptivas, com a automação de tarefas rotineiras e o "machine learning" em franca aceleração, muitos empregos tradicionais já estão a ser transformados ou substituídos. E, mais virão, num futuro próximo. Como resultado, surge a necessidade premente de reskilling (reorientação profissional)- o processo de adquirir novas competências para se manter relevante no mercado de trabalho em constante evolução. Este desafio não se limita apenas a indivíduos, mas também se estende a organizações e governos, que devem colaborar para garantir que todos tenham acesso às oportunidades de reskilling necessárias para prosperar na economia do futuro.

Assim, ao abordarmos alguns dos pontos destacados pela investigadora e autora Hermínia Ibarra sobre as dificuldades da transição de carreira, e ao olharmos para estratégias de superação desses desafios, devemos fazê-lo com uma compreensão clara da importância de todos nos mantermos proativos na nossa jornada de desenvolvimento pessoal/profissional.

Eis alguns dos pontos que mais dificultam a mudança profissional:

1. Desafio da Mudança de Identidade

"E terei de abdicar de tudo o que fui até hoje?"

Um dos maiores obstáculos na transição de carreira é o desafio de mudar a nossa identidade profissional, que muitas vezes se confunde com o nosso estatuto na sociedade. Durante anos, identificamo-nos com um determinado papel ou indústria, e mudar essa identidade pode ser assustador.

"Sem a cobertura e o apoio de um empregador tradicional e uma identidade profissional estável, podemos rapidamente começar a sentir-nos perdidos, ansiosos, irrelevantes e inseguros. Estes sentimentos podem ser fortemente amplificados se, em vez de optar por deixar o seu emprego, tiver sido dispensado ou despedido", refere Hermínia Ibarra.

No entanto, é importante reconhecer que a nossa identidade profissional é fluida e que podemos explorar novas facetas de nós mesmos ao longo da vida. Para isso, peço-te que reflitas no seguinte: não somos "o cargo ou a função" que desempenhamos, mas antes o profissional que desempenha um cargo ou uma função. A nossa identidade profissional não deve ser o que fazemos, mas quem somos ao fazermos o que fazemos; o que nos torna únicos e especiais no desempenho dessas funções; como fazemos o que fazemos e, sobretudo, porque o fazemos. E aí que vamos buscar sentido..

Para superar esse desafio de nos destacarmos do que fazemos, é fundamental praticar a autorreflexão e estar aberto a novas possibilidades, de acolher e de abraçar o potencial de termos uma identidade profissional mais aberta e diversa.

2. Necessidade de Exploração

"Não sei o que quero fazer a seguir".

Muitas vezes, a transição de carreira requer uma fase de exploração ativa. Isso significa experimentar diferentes áreas, funções e indústrias para descobrir onde realmente se encaixam os nossos interesses e competências atuais. Em vez de nos sentirmos pressionados a tomar uma decisão rápida, é importante permitirmo-nos explorar, investigar, recolher informações sem medo de estarmos no trilho errado. Através da exploração, podemos descobrir novas paixões e direções para a nossa carreira.

O "truque" reside em não tomarmos decisões precipitadas mas sim, permitirmo-nos explorar com curiosidade diferentes caminhos sem nos comprometermos demasiado cedo com nenhum.

3. Importância da Experimentação

"Não tenho tempo".

A experimentação desempenha um papel crucial na transição de carreira. Ao experimentar novas atividades e projetos, podemos expandir as nossas competências e descobrir o que realmente nos motiva. Contudo, experimentar é visto como algo difícil, sobretudo para quem tem mais de 40 anos. De facto, experimentar requer que se mergulhe em algo, ainda que de forma superficial. Muitas vezes as pessoas que querem fazer uma transição de carreira referem "não ter tempo", "não terem disponibilidade" ou "não se sentirem à vontade" para experimentar novas funções.

Aqui, o primeiro conselho é mesmo o de não ter medo de sair da zona de conforto e testar coisas novas. No processo de transição de carreira é importante abraçarmos o máximo de oportunidades para testarmos outras áreas e outros papeis. Essas serão as aprendizagens mais valiosas para redirecionar o nosso caminho profissional.

O segundo conselho é o de, num primeiro momento, poderes manter o teu atual trabalho (caso isso seja possível) enquanto exploras outros caminhos. Isso poderá retirar o peso de teres "a decisão certa".

Desfrutar desse processo de exploração, com genuína curiosidade, é o caminho mais fácil para retirar o máximo de informação acerca de cada experiência de uma forma leve, interessante e prazerosa.

4. Desafio das Redes de Contato

"Não me sinto à vontade".

Construir novas redes de contatos é essencial para uma transição de carreira bem-sucedida, mas muitas pessoas referem ser difícil inserirem-se em novos círculos profissionais, sobretudo as que têm carreiras profissionais mais longas. Falam da dificuldade em se exporem e de se sentirem vulneráveis nesse processo. Mas, ultrapassar essas questões pode ser um factor-chave, como nos explica Herminia Ibarra:

"Crescemos profissionalmente nas nossas relações com os outros e através delas. Mas quando se trata de mudar de carreira, as ligações que já temos não costumam ser assim tão úteis. É necessário construir as suas relações de duas formas: através da criação de pontes, o que implica criar ou reativar relações para além do seu círculo social atual, e através da criação de laços, o que implica aprofundar os laços e encontrar uma comunidade de pessoas com a mesma abertura ou os mesmos desafios", sugere a autora.

Para superar esse desafio, é importante ser proativo na construção de relacionamentos e estar aberto a oportunidades de networking. Participar em eventos, participar em formações e workshops podem ser ótimas maneiras de expandires a tua rede de contatos e de fazeres novas conexões. Integrares um grupo de pessoas com os mesmos objetivos, será sempre uma forma interessante de te sentires apoiado e compreendido, além de poderes ter acesso a redes de conexão mais vastas através dessas pessoas.

5. Mentalidade de Crescimento

"Eu não sou capaz".

Quando estás a pensar fazer uma mudança profissional tens de abandonar o sentimento de "não ser capaz" e substituí-lo por uma "Mentalidade de crescimento" - a crença de és capaz de melhorares ativamente as tuas capacidades atuais e de fazeres novas aprendizagens.

Mas dominar essa mentalidade do "poder fazer" pode ser mais difícil do que parece. É preciso enfrentar as dificuldades que surgem com serenidade, aprender com as críticas e persistir frente às adversidades maiores. Mesmo se acreditarmos que desenvolver essa tenacidade vale a pena para podermos viver vidas profissionais mais alinhadas com quem somos, as dúvidas e os medos, na prática, podem dominar-nos.

Fundamentalmente, as pessoas que adoptam uma mentalidade de crescimento acreditam que são capazes de melhorar e de dividir as dificuldades em etapas que podem ser alcançadas.

Isso significa sair da zona de conforto e aceitar um certo nível de risco, incerteza e a possibilidade de fracasso decorrente de tentar algo novo. Em paralelo, também assumes o potencial de aprenderes algo novo, de cresceres como indivíduo e de seres bem-sucedido.

Em vez de veres a mudança como uma ameaça, encara-a como uma oportunidade de crescimento e de desenvolvimento. Está disposto a aprender com os desafios e a te adaptares às novas circunstâncias. Uma mentalidade de crescimento permite-nos abraçar a mudança com confiança e determinação, transformando os desafios em oportunidades de sucesso.

Como vimos, na jornada de mudança profissional, é normal encontrarmos desafios que nos parecem difíceis de ultrapassar. Contudo, é essencial que todos compreendamos a importância da adaptabilidade e da aprendizagem contínua (independentemente da idade ou do estágio profissional em que estejamos) nesta era da rápida mudança tecnológica, pois todos seremos chamados a acompanhar a evolução do mercado de trabalho.

Mais do que proteger a nossa identidade profissional ou de correr a procurar uma nova, devemos dar tempo ao tempo para explorar e experimentar novos caminhos, recolhendo informação valiosa para a nossa reinvenção profissional. Mais do que corrermos atrás das respostas certas, devemos abraçar a exploração e a experiência, como caminhos válidos para crescermos e aprendermos nesta jornada.

Ao abraçares a mentalidade certa e as estratégias mais eficazes sentir-te-ás cada vez mais preparado para reescreveres a tua história profissional. Uma e outra vez.